Enturmando

Jogar bem vale um rim.

Escrevendo sobre a Confraria Lúdica e os grupos de jogadores, lembrei de dois textos que coletei há anos, publicados na Ilha do Tabuleiro. Foram escritos por dois amigos do Heavy Games Brasília, e contam como eles chegaram até a formidável comunidade dos jogadores. Bruno e Zinho contam:

Bruno (quertzacoalt)

Também sou relativamente novo entre a galera. Pouco mais de 1 ano, acho. Mas este curto período já foi suficiente para criar laços de amizades que já extrapolam as mesas de jogos.

Na minha primeira jogatina, também fiz como o Rafael: engoli a vergonha, assumi a cara de pau, me convidei para uma mesa de um jogo que queria conhecer e fui bater na porta da casa da pessoa no dia e hora marcada.

Lembro da minha namorada perguntando onde eu estava indo. Eu respondi na casa de um cara, jogar um jogo . Daí ela: que cara? seu amigo? . Eu: não . Ela: e você conhece ele de onde? . Eu: não conheço, fiquei sabendo do jogo por um site na internet . Ela: ele te conhece? . Eu: também não . Ela: e ele tem coragem de te receber assim, do nada, na casa dele, sem saber se você é um maníaco ou coisa do gênero? . Eu: pois é… o mesmo vale pra mim… mas vou lá! .

O resultado não poderia ter sido melhor. Fui super bem recebido pelo Sérgio (e Rita) e a sessão de jogo foi divertidíssima, já com direito a muitas risadas. Neste tempo todo, não houve uma situação sequer em que eu me senti desconfortável numa mesa de jogo. O pessoal é 10.

Uma coisa que admiro pra caramba no pessoal é o sentimento de comunidade e ânsia de divulgação do hobby que existe entre a galera. O pessoal faz tudo de coração, boa vontade mesmo, e nunca quer nada em troca (a não ser companhia na mesa de jogo).

Depois fiquei viajando nessa postura… Brasiliense nato que sou, cresci acustumado com os bairrismos (ou quadrismos ) extremos e panelas hermeticamente fechadas da nossa BSB. Quando me deparei com uma galera que abria a porta de casa, te convidava para entrar já com uns tapinhas nas costas e continuava a fazer isso em outras oportunidades, te encorajando para aparecer mais e trazer mais pessoas, eu fiquei realmente encantado!

Tudo bem que numa dessas perdi um rim. (Pronto, Thiago, agora vc sabe de um caso). Mas sem galho! A oferta tá grande no mercado e consegui outro ainda melhor! E bem baratinho! 😁

Mas é bem como o Thiago falou: ficamos mais do que felizes em ver gente nova na mesa. Não conhece o jogo? A regra? Sem problema! 99% das vezes rola explicação das regras antes da partida, mesmo! E durante o jogo, se esquecer de alguma coisa? Sem rolo! Pergunte mesmo! Fazemos isso o tempo todo.

Faço coro às demais vozes: chame seu amigo e apareça em uma mesa. O pessoal é muito gente fina! Assim vocês já entram no panelão e já podem começar a trazer mais gente para ele também!

Zinho

Há dois anos e pouco atrás voltei dos EUA com um bando de jogos debaixo do braço e cheguei em Brasília sem ter ninguém pra jogar (looooonga história).

No BGG (site que achei por acaso) um australiano me falou que eu conseguiria, clicando na bandeirinha, saber quem do Brasil estava cadastrado lá.

Cliquei e encontrei o Luiz Cláudio. Mandei um e-mail pra ele perguntando onde se jogavam esses troços por aqui, ao que ele respondeu:

– No próximo final de semana vou organizar uma reunião aberta aqui em casa. Você será bem-vindo.

Eu:

– Como assim, reunião aberta?

– Aberta! Pode vir quem quiser.

– Qualquer um? Mendigo? Psicopata? Cachorro sarnento?

– Qualquer um é bem-vindo.

Antes de ir, falei pra minha esposa onde eu estava indo e que, se eu não ligasse em 30 minutos, ela podia chamar a polícia. 😂

Mas era verdade. Qualquer um era bem-vindo e eu cheguei lá às três da tarde e saí às três da manhã. Com os rins doídos de tanto dar risada, mas originais de fábrica.

Esse hobby é meio obscuro e, ao que parece, tem a capacidade de atrair gente boa. Nunca vi briga, nunca vi ninguém bêbado (nem em eventos com bebida), nunca vi ninguém falando mal de ninguém pelas costas (pela frente é só ler os fóruns 😒), nunca vi ninguém esnobar novato ou se negar a explicar uma regra e, mesmo quando o jogo não é bom (acontece…), invariavelmente volto pra casa mais leve e animado.

Dessa iniciativa maluca de aparecer na casa de um completo desconhecido, acabamos por construir boas amizades e muitos de nós já curtimos juntos: aniversários, nascimentos de filhos, anos-novos, almoços, despedidas, lanches, shows e, claro, muitos jogos.

O Quartelmestre
O Quartelmestre
polímata
filomático
pesquisador
escritor

LUIZ CLÁUDIO, o Quartelmestre, the Rules Lawyer, conversa e escreve sobre jogadores e jogos de todos os tipos, sobre ludologia, narrativas, poesia, e mais.

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